sábado, 28 de novembro de 2015

piolho poético

                                   
 (Fátima Fonseca)
  
subi pelo paletó do poeta
cheguei ao seu eu lírico
sorvendo as letras 
como se fosse comida
fiquei enfeitiçado pela magia
e apaixonei por essa cabeça

tão logo fui descoberto!
que ironia a minha                                                                   
acreditar em ir mais além
fui levado para as pontas dos dedos
poesia vai
poesia vem
eu penso:
sou apenas um piolho qualquer

espremido entre as unhas
derramei em vermelho
uma caneta por favor!
preciso escrever com seu sangue:
poesia-me


quinta-feira, 26 de novembro de 2015


(...) tinham-me feito descobrir uma riqueza inédita: a solidão rodeada de livros.
Miguel Torga

Súplica


Miguel Torga
Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

PRECISO PARA


Marina Colasanti
Preciso que um barco atravesse o mar
lá longe
para sair dessa cadeira
para esquecer esse computador
e ter olhos de sal
boca de peixe
e o vento frio batendo nas escamas.
Preciso que uma proa atravesse a carne
cá dentro
para andar sobre as águas
deitar nas ilhas e
olhar de longe esse prédio
essa sala
essa mulher sentada diante do computador
que bebe a branca luz eletrônica
e pensa no mar.

domingo, 22 de novembro de 2015

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

escrevo, com a ponta dos nervos,
meus versos praquês
sem ter
eu por quês, - com o grão de meus dedos,
cegamente, correndo as paredes
sem poder lhes passar

 Manoel Huires Alves

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

máquina de costura (homenagem a minha tia Cida. amor desdobrado em materno e poesia)


                                                           Fátima Fonseca
bastou eu receber da amiga Antônia  
a foto daquela máquina de costura  
que desabotoou dentro de mim 
os seus pés pedalando 
os carreteis 
as fitas 
os tecidos de florzinhas miúdas...
e as sábias palavras da minha tia Cida 

sinto seu ar triste e meigo 
fazer cafuné nos meus olhos de suplicio 

agora quem es tu que esvais demente, trêmula, atrofiada? 
estas em mim e fora de mim 
Senhor que fazer com esse desfecho? 
que fazer com tanta angustia? 

costureira de mão cheia 
sua arte era cerzida de poesia 
me lembro que as vezes recusava um convite qualquer dizendo: 
"não posso! estou apertada de costura"

impotente diante do quadro 
só me resta elevar uma oração 
fé que me ensinaste.  

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

café, prosa e poemas na terça escrita




No quintal da menina tinha "caliandra",
Mas ela nunca soube.
Tinha vassourinha
Esponjinha-vermelha
Broche-rubi-de-princesa.
Mimosinha.
Tantos nomes possuía a flor
espalhada entre as pedras e capins
Porém, caliandra, ali ninguém conhecia.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015



gosto das palavras com pele
vestidas com discreta elegância
seja do direito seja do avesso
seja pra elogiar seja pra vomitar
essa virtude silenciosa
de falar do infamo com exuberância.
                                    fátima fonseca

domingo, 8 de novembro de 2015

mundo da lua


sempre vivi no mundo da lua
conheço cada miudeza dos céus

já fui balharina em festas de urubus
                                                  fátima fonseca

sexta-feira, 6 de novembro de 2015


Algumas de suas frases lapidares

"A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas, capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo..."

"Não precisa correr tanto, o que é seu às mãos lhe há de vir..."

"A mentira é muita vez tão involuntária como a respiração."

"Mas o tempo, o tempo caleja a sensibilidade."

"Não é amigo aquele que alardeia a amizade: é traficante; a amizade sente-se, não se diz."

"(...) Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis (...)"

"Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho,há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!"

"A gratidão de quem recebe um benefício é bem menor que o prazer daquele de quem o faz."

"As coisas valem pelas idéias que nos sugerem."

"As pessoas valem o que valem para a afeição da gente."

"Lágrimas não são argumentos."

"O dinheiro não traz felicidade — para quem não sabe o que fazer com ele."

"Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar."

"Não te irrites se te pagarem mal um benefício; antes cair das nuvens que de um terceiro andar."

"É melhor, muito melhor, contentar-se com a realidade; se ela não é tão brilhante como os sonhos, tem pelo menos a vantagem de existir."

"O acaso... é um Deus e um diabo ao mesmo tempo."

"Eu sinto a nostalgia da imoralidade."

"A moral é uma, os pecados são diferentes."

"A loucura é uma ilha perdida no oceano da razão."

"A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal."

"Para as rosas, escreveu alguém, o jardineiro é eterno."

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

amor


na pele do meu jardim
bichinhos com asas
namoram as violetas

meu coração disparou
e eu fiquei em silêncio, quieta...
sentindo  o brotar
o pulsar das violetas
roxas de amor.
                                  fátima fonseca



orvalhos derretendo 
de amores pelo sol
a luz  do dia
e eu poesia-me
                                        
Dor elegante

Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante

Carrega o peso da dor
Como se portasse medalhas
Uma coroa, um milhão de dólares
Ou coisa que os valha

Ópios, édens, analgésicos
Não me toquem nesse dor
Ela é tudo o que me sobra
Sofrer vai ser a minha última obra
                                   Paulo Leminski

A partir desta data,
Aquela mágoa sem remédio
É considerada nula
E sobre ela, silêncio perpétuo.
                               Paulo Leminski

O destino quis que a gente
se achasse, na mesma estrofe
e na mesma classe,
no mesmo verso
e na mesma frase.
                              Paulo Leminski
isso de querer ser 
exatamente aquilo 
que a gente é 
ainda vai 
nos levar além
          Paulo Leminski

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Noite adentro



Atado a um barco na noite
o sono curva-se sobre si mesmo,
entregue ao movimento secreto das ondas.
Durmo, acordo, vem dos livros fechados
o cheiro escuro dos sargaços.
Neste quarto, noite adentro, percebe-se
a presença perturbadora do mar:
nas estantes, nos tapetes, nos móveis submersos.
Nas paredes lisas de cansaço.
Sou jogada no sono de um sonho a outro,
lançada entre corais, como um peixe
que dorme na ressaca.
Quando for preciso novamente
acordar para o dia,
o mar terá se afastado lentamente
e voltado a ocupar o lugar
onde o vejo
pela janela esquerda do quarto.

Ana Martins Marques

terça-feira, 3 de novembro de 2015

amor


sim poeta o amor é líquido!
escorregadiço
pode vazar sem alardes
e não adianta repor de cuidados
depois que ele aprendeu a escapar.
                                              fátima fonseca

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

pupilas dilatadas de estrelas,
pele empolada  de emoções,
alagamentos de saudades torrentes,
pancadas de frustações
beijos crateras.

acorda!  você exagera demais
                                           fátima fonseca