sábado, 28 de dezembro de 2013

RECEITA DE ANO NOVO


Carlos Drummond de Andrade 

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Feliz Natal ...


Flávia Lacerda
Feliz, alegre, sorridente
Sorrir e mostrar os dentes
Leveza, chuva, sol, saudade
Tudo pode se é de verdade
De mentira só de quando em vez
Após perder a sensatez
E se encontrar na loucura e na incerteza da vida.
Que o natal aconteça em você, em mim, nos seus e nos meus.
Feliz natal!

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Que neste Natal...


eu possa lembrar dos que vivem em guerra,
e fazer por eles uma prece de paz.

Que eu possa lembrar dos que odeiam,
e fazer por eles uma prece de amor.

Que eu possa perdoar a todos que me magoaram,
e fazer por eles uma prece de perdão.

Que eu lembre dos desesperados,
e faça por eles uma prece de esperança.

Que eu esqueça as tristezas do ano que termina,
e faça uma prece de alegria.

Que eu possa acreditar que o mundo ainda pode ser melhor,
e faça por ele uma prece de fé.

Obrigada Senhor
Por ter alimento,
quando tantos passam o ano com fome.

Por ter saúde,
quando tantos sofrem neste momento.

Por ter um lar,
quando tantos dormem nas ruas.

Por ser feliz,
quando tantos choram na solidão.

Por ter amor,
quantos tantos vivem no ódio.

Pela minha paz,
quando tantos vivem o horror da guerra.
autor desconecido

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

maturidade

A maturidade do homem consiste em haver reencontrado a seriedade que tinha no jogo quando era criança.
Friedrich Nietzsche

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Canção na plenitude

Lia Luft

Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.

domingo, 15 de dezembro de 2013

SONETO A CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Emílio Moura

A hora madura envolve-te e palpita
nela o que ora te oferta, ora recusa:
posse do que és, na solidão recôndita,
graça de amar, ressurreição dos mitos.

Claros enigmas riscam céus distantes.
Falam-te as coisas pela voz que é o próprio
sentimento do mundo e pela meiga
sombra gentil que ressuscita a infância.

Ouço-te andar nas lajes desta rua,
que nem sei se é de Minas ou de alguma
pátria remota que ao teu canto se abre.

E amo-te a voz multiplicada em ecos:
verbo dócil à força íntima e pura
que à máquina do mundo se incorpora.

sábado, 14 de dezembro de 2013

CONSTRUÇÃO


Dagmar Braga
Lanhada a pedra,
faço-me fio,
partilho, rasgo
entranha e estranho.

Quebrado o leme,
desoriento,
acolho vento,
maré e abismo.

Cavado o poço,
torno-me água,
mão retorcida,
lisura e barro.

Feito o silêncio,
lasso a palavra -
gume sequioso
de outra navalha.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Neste Natal precisamos...


Ronald Claver
acordar o Menino que vive em nós
plantar gerânios, margaridas e sonhos
colher luas  e esperanças
pousar a cabeça em algum ocaso
e acender a estrela-guia que nos norteia

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Reinvenção

Cecília Meireles

A vida só é possível reinventada.
Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas. . .
Ah! Tudo bolhas que vêm de fundas piscinas de ilusionismo... – mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.
Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcança...
Só - no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva.
Só - na trevas fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

chuva


Fernando Pessoa
Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva
Não faz ruído senão com sossego.
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva
Do que não sabe, o sentimento é cego.
Chove. Meu ser (quem sou) renego…

Tão calma é a chuva que se solta no ar
(Nem parece de nuvens) que parece
Que não é chuva, mas um sussurrar
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece.
Chove. Nada apetece…

Não paira vento, não há céu que eu sinta.
Chove longínqua e indistintamente,
Como uma coisa certa que nos minta,
Como um grande desejo que nos mente.
Chove. Nada em mim sente…

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Nunca e Sempre



Helena Kolody 

Sempre cheguei tarde 
ou cedo demais. 
Não vi a felicidade acontecer.

Nunca floresceram 
em minha primavera 
as rosas que sonhei colher.

Mas sempre os passarinhos 
cantaram e fizeram ninhos 
pelos beirais 
do meu viver. 

domingo, 8 de dezembro de 2013

8 de dezembro, aniversário de nascimento e morte da ilustre poetisa portuguesa Florbela Espanca



Há uma primavera em cada vida: é preciso cantá-la assim florida, pois se Deus nos deu voz, foi para cantar! E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada que seja a minha noite uma alvorada, que me saiba perder...para me encontrar....
Florbela Espanca

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Tudo o que vejo

Viviane Mosé

Era tarde nas janelas da sala,
Um gosto de tarde que eu queria lamber.
Tenho vontade de lamber as coisas que gosto,
Mesmo as que não gosto costumo lamber sem querer.
Às vezes com a língua mesmo.
Molhada e escorrida.
Outras vezes uso a língua da palavra,
Quando tem cheiros ruins
Ou asperezas estranhas ao paladar de minha pessoa,
Ou por nada mesmo por gosto
Passo a língua nas coisas que vejo
E passo as coisas que vejo pra língua.

domingo, 1 de dezembro de 2013



Viviane Mosé
Eu poderia chorar de coisas assim:
Corre um rio de minha boca, corre um rio de minhas mãos.
Dos meus olhos corre um rio.
Na verdade sofro de excessos, que me dão certo vocabulário
Como derramar, escorrer, atravessar.
Tenho a impressão de que tudo vaza em sobras.
Tenho dificuldade em caber.
Pra caber mais, derramo por nada, derramo sem motivo.
Vou acalmar meu excesso pensei (...)
Palavras são estacas fincadas ao chão.
Pedras onde piso nessa imensa correnteza que atravesso.