segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

acento no céu

Fátima Fonseca
foi por causa dessa mania
de andar com a cabeça na lua
que descobri um acento arguto
no Céu.

sábado, 26 de janeiro de 2013

súplica do jequitibá


Fátima fonseca
 jequitibá frondosa
cresci retorcida a todo custo
as flores dependuradas
são das trepadeiras
parasitas em mim

renitentes  ramificações
instinto primitivo
enlouquecidos  por viver 
 fazem de mim seu sustento
Oh, raios! Oh, céus! Oh, tempestardes!
Arranquem esses fluídos daninhos de mim!


Quem eu sou?



Fátima Fonseca
Sou abstrata
tenho sede de estrelas
sou viciada em poesias
ourives de minha loucura

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Ternura



Vinícius de Moraes

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor
seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentando
Pela graça indizível
dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura
dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer
que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas
nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras
dos véus da alma...
É um sossego, uma unção,
um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta,
muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite
encontrem sem fatalidade
o olhar estático da aurora.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

De tudo ficam três coisas:



Fernando Sabino
"De tudo ficam três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando
A certeza de que é preciso continuar
E a certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminarmos.
Devemos fazer da interrupção um caminho novo,
Da queda uma dança
Do medo uma escada
Do sonho uma ponte
Da procura um encontro"

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

adubo para os meus vasos sanguíneos



Fátima Fonseca
gosto de juntar caixinhas, fitinhas, papeis de presente... 
tenho dificuldade em jogar fora, tenho apego as coisitas 
quando criança as tampinhas de pasta dental serviam de vasos com flores silvestre para enfeitar minha casinha de bonecas

ai Manoel de Barros vem me dizer:
“Os objetos sem função têm muito apego pelo abandono.
Também as latrinas desprezadas que servem para ter
grilos dentro - elas podem um dia milagrar violetas.
Eu sou beato em violetas.
Todas as coisas apropriadas ao abandono me religam a Deus.
Senhor, eu tenho orgulho do imprestável!
O abandono me protege”

Eu também sou beata em florzinhas miúdas que nasceram às margens, ao léu
essas bobagens são adubo para meus vasos sanguíneos 

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Cidadezinha cheia de graça




                                                 Mário Quintana


Cidadezinha cheia de graça…

Tão pequenina que até causa dó!

Com seus burricos a pastar na praça…

Sua igrejinha de uma torre só.


Nuvens que venham, nuvens e asas,

Não param nunca, nem um segundo…

E fica a torre sobre as velhas casas,

Fica cismando como é vasto o mundo!…


Eu que de longe venho perdido,

Sem pouso fixo ( que triste sina!)

Ah, quem me dera ter lá nascido!


Lá toda a vida poder morar!

Cidadezinha… Tão pequenina

Que toda cabe num só olhar…

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Receita para dias de chuva




Receita para dias de chuva


Dia de chuva é para viajar
na neblina e no vento
para dentro para dentro

um livro fechado espera
que se abram suas portas
com as chaves do pensamento

Roseana Murray

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Silêncio



O silêncio

É de silêncio
o nome que te chamo
meu amor sem nome
conhecido
dum silêncio que grita
em meu ouvido
 ânsia dor
com que te amo!
É de sede o beijo
que te ofereço
desta imensa sede
que é tortura
esta falta de água
esta amargura
pela falta dessa boca
que reclamo!
É de fome o abraço
que te peço
da fome de quem vem
doutras paragens
dessa de quem fez
tantas viagens
é de fome o abraço
que te peço!
É de sonho a vida
que procuro
do sonho de quem busca
e ousa e quer
do sonho que é mais sonho
na Mulher
é de sonho a vida
que procuro!
É de silêncio a força
com que te amo
esta força trovão
à flor da pele
(desco


esta força que cresce
e que me impele
e é de silêncio o nome
que te chamo!...
(desconheço a autoria)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Paul Celan




 QUANDO ME ABANDONEI EM TI,  
eras pensamento,  

algo  
murmura entre nós dois:  
do mundo a primeira  
das últimas  
asas,

em mim cresce  
a pele sobre  
tempestuosa  
boca,   tu não chegas até ti.

( tradução: Claudia Cavalcanti )

sábado, 12 de janeiro de 2013

sou de barro



Fátima Fonseca
moringa



sou de barro
pisado
batido
amassado, queimado...

um fio de água doce
faz a curva em mim

sou moringa

sua sede murmura cristalina
nas minhas encostas  barrentas.


vasio




Fátima Fonseca
sangue verde
sou dama da noite
chuva de prata
espada de São Jorge
amor perfeito e alecrim.

preciso de amor esverdeado dentro de mim.


amor



Tenho um amor fresco e com gosto de chuva e raios e urgências. Tenho um amor que me veio pronto, assim, água que caiu de repente, nuvem que não passa. Me escorrem desejos pelo rosto pelo corpo. Um amor susto. Um amor raio trovão fazendo barulho. Me bagunça. E chove em mim todos os dias.

Caio f. Abreu 

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Desenho




Cecília Meireles

Traça a reta e a curva,
a quebrada e a sinuosa
Tudo é preciso.
De tudo viverás.

Cuida com exatidão da perpendicular
e das paralelas perfeitas.
Com apurado rigor.
Sem esquadro, sem nível, sem fio de prumo,
traçarás perspectivas, projetarás estruturas.
Número, ritmo, distância, dimensão.
Tens os teus olhos, o teu pulso, a tua memória.

Construirás os labirintos impermanentes
que sucessivamente habitarás.

Todos os dias estarás refazendo o teu desenho.
Não te fatigues logo. Tens trabalho para toda a vida.
E nem para o teu sepulcro terás a medida certa.

Somos sempre um pouco menos do que pensávamos.
Raramente, um pouco mais.

*            *            *

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

maturidade


Martha Medeiros
Quero que o fato de ter uma vida prática e sensata 
não me roube o direito ao devaneio. 
Que eu nunca aceite a idéia de que a maturidade 
exige um certo conformismo."

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Confidência do Itabirano




Carlos Drummond de Andrade 
Confidência do Itabirano

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa…
Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Clarice Lispector




Sou composta por urgências: 

Minhas alegrias são intensas. 
Minhas tristezas, absolutas. 
Entupo-me de ausências.
Esvazio-me de excessos. 
Eu não caibo no estreito.
Eu só vivo nos extremos.


Clarice Lispector

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Carpinejar



"Eu amo quando não me forço a existir.  
O que falta fazer não me cansa. 
Ainda não cumpri tanta coisa, 
que não me apresso em pontuar. 
Farto-me de esperança. 
Vou imaginando devagarzinho para não acabar."

domingo, 6 de janeiro de 2013

Ana Jácomo



Estive pensando nesse mistério que faz com que a vida da gente se encante tanto por outra vida. E sinta vontade de escrever poemas. Garimpar estrelas. Deixar florir pelo corpo os sorrisos que nascem no coração.


quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Cerrado Norte de Minas Gerais lembranças da infância


Fátima Fonseca
macaquinhos no terreiro
ressabiados espiavam dentro da cozinha
rapadura  adoçava a tábua
deitada aos pés do fogão de lenha.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Metereologia

Fátima Fonseca




sou vento em direção oposta 
pancadas de emoções 
lembranças granizos 
crateras profundas
 vivo a chover sozinha  
alagamentos e enxurradas torrentes 

está previsto calor e muito sol para amanhã 
raios de desejos 
 alta temperatura para o coração.
e muita poesia estendida no varal.



terça-feira, 1 de janeiro de 2013

DEUS É EXATO



DEUS É EXATO

Não conheço as relações de Girard
Nem o algoritmo de Briot-Ruffini.

Não estudei o princípio de Cavalieri
Nem o binômio de Newton.

Não domino o teorema de Pitágoras
Nem o crivo de Eratóstenes.

Eu só sei que Deus existe e isso é exato
anônimo