«A poesia, nos nossos dias, expõe-se a um perigo que não vem dela, mas da palavra que se lhe refere. Ela é ofuscada por essa palavra. O leitor já não lê o poema, lê o poeta, as suas referências, as suas inclinações. Lê o que lhe declaram do poeta e da poesia. O poeta tornou-se para o crítico um meio de afirmar as suas opções, de expor as suas teorias, não de dar acesso ao poema enquanto tal. Trata-se aqui de uma crítica que decifra a poesia por intermédio do mundo. A verdadeira crítica é o seu oposto, desvenda o mundo através da poesia. Acede às energias da própria língua sem outro instrumento que não seja só a poesia.» obs desconheço autoria
Lá no interior era assim
mulheres nos saltos altos se equilibrando
nos paralelepidos e buracos das ruas estreitas
os homens avaliando
e os que tinham motorizados
cantavam pneus para elas
Meio à pobreza reinava naquela cidadezinha
um competir mesquinho
Traços de insignificâncias
no desespero dos rostos
denunciavam como a vida ê vã
Todos tinham a senha da soberba
o reconhecimento pelo ter
a indiferença disfarsada
Eu sumo desse desdém
me continha pequena ser
Cercada de mim.
Sem saltos altos
Hoje escrevo poemas
com os pés descalços
de uma Cinderela que nunca
fui.
Fátima Fonseca
se você é Lua
eu sou Sol
mas por favor não se intimide comigo
porque o que existe de grande em mim
são as florezinhas miúdas do cerrado
uma sede de amor e justiça
que não me deixam desistir
de brilhar
de sonhar
mesmo que me falem
de
impossibilidades.
De repente envelheci
Fiquei antiga na era digital
Para me reinventar busquei as palavras
Encontrei salvação no convite sagrado dos versos
Descobri com o poeta “escrever não dói”
Aprendi escutar a voz que vem de dentro
enxergar a cor do céu
a flor que fura o asfalto
alimentar dos milagres dos instantes
O que seria de mim se não fosse a escrita?
Sem a escrita eu seria Chico Buarque sem a Gota D’água
Espanca sem Florbela
Guimarães sem o Rosa
Ora, sem a escrita eu seria o vazio do inativo
Solidão sem utopia
Silêncio sem poesia